Sabemos que o mundo está envelhecendo rapidamente. Em dados globais, a Organização Mundial da Saúde estima que em 2050 o número de pessoas com mais de 60 anos poderá alcançar os 22%, chegando a 90 milhões de pessoas no Brasil.
Esses dados nos fazem refletir sobre os desafios que temos pela frente e quais recursos disponibilizamos para dar as respostas para o envelhecimento da população.
O conceito de envelhecimento ativo sugere uma perspetiva positiva, compreendendo uma vida longa. Para a Organização Mundial da Saúde, envelhecimento ativo é o “processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas”. (OMS, 2002)
Sabemos que, somados ao envelhecimento da população, estão ocorrendo grandes mudanças sociais que podem significar uma forma de envelhecer diferente das experiências de gerações anteriores. À medida que ficam mais velhas, as pessoas têm necessidade de viver em ambientes que lhes proporcionem o suporte necessário para compensar as mudanças associadas ao envelhecimento, algumas delas sinônimo de perda de capacidades, implicando na necessidade de adaptação do ambiente físico e social à vida cotidiana.
O conceito do Ageing in place é a política emergente que focaliza essa discussão na compreensão das mudanças que ocorrem no envelhecimento e no seu ambiente envolvente, elegendo a manutenção da pessoa no seu meio natural como meio preferencial de vida (Pynoos et al. 2012a).
A criação e manutenção de ambientes favoráveis e facilitadores do envelhecimento é uma tarefa indispensável para a promoção do bem-estar das pessoas idosas e para que elas possam continuar a ser, pelo maior tempo possível, autônomas e socialmente relevantes.
Milligan (2009) defende que a vida independente contribui para manter um sentido de autoconfiança, autocontrole e autoestima positivo, fazendo com que os idosos possam viver de forma independente desde que a sua situação de saúde permita e que disponham de uma residência e de apoio social adequados.
A valorização de respostas de Ageing in place significa responder às necessidades de assistência a partir do contexto onde a pessoa vive, procurando respostas articuladas através de uma integração progressivamente mais ampliada de serviços. Isto significa não retirar a pessoa do local onde ela vive para lhe proporcionar o que ela necessita, mas criar condições para que as suas necessidades sejam satisfeitas.
Para além da preocupação com a habitação e os espaços comunitários, medidas de assistência no domicílio ou programas de natureza social que considerem as progressivas limitações funcionais dos indivíduos são importantes para reforçar a autonomia e a independência. É necessário conjugar respostas adequadas em diversos domínios de intervenção, respondendo aos desafios da população cada vez mais envelhecida.
O ageing in place pode ser visto como a opção mais vantajosa em termos de prestação de cuidados de saúde, podendo ser facilitada pela introdução de tecnologias que permitam monitorizar a segurança das pessoas e que promovam a comunicação e o envolvimento social.
Contudo, o ageing in place pode não deve ser a solução adotada para pessoas idosas que estejam isoladas ou para aquelas que vivem em ambientes inseguros e degradados. Por vezes, corre-se o risco de encarar o ageing in place como uma solução para reduzir custos assistenciais, quando em idades mais avançadas surge a incapacidade funcional, o sucesso da adoção de uma política de envelhecimento em casa requer a existência de familiares ou de cuidadores que permitam à pessoa idosa ser acompanhada para assegurar o seu bem-estar, ou até mesmo a sua sobrevivência.
No 2º Fórum Global da Organização Mundial da Saúde sobre Inovação para Populações Envelhecidas (WHO, 2015), são identificadas as cinco principais áreas de intervenção no processo de ageing in place: pessoas, lugares, produtos, serviços personalizados, políticas de apoio social (no original, the 5 P’s – People, Place, Products, Person-centered services, Policy).
Para terem sucesso, estas diferentes áreas necessitam estar sustentadas em políticas de envelhecimento baseadas em evidências, em iniciativas multissectoriais coordenadas e com um horizonte de sustentabilidade, e em orçamentos alocados aos diversos atores sociopolíticos responsáveis pela sua implementação.
Uma vida autônoma exige ajustamentos sucessivos à medida que as necessidades individuais e o contexto mudam.
Há situações em que permanecer em casa corresponde efetivamente a um envelhecimento mais satisfatório, sobretudo quando a vida independente garante privacidade e permite a continuidade do controle sobre a vida pessoal (Philips, Ajrouch & Hillcoat-Nallétamby, 2010), mas em outras situações permanecer em casa não é sinônimo de qualidade de vida, isso quando os indivíduos estão confinados a um ambiente inapropriado, situação que pode ter efeitos contraproducentes como isolamento, solidão e desconexão com o ambiente social envolvente (Kohli, Künemund & Zähle, 2005).
Portanto, o melhor lugar para se envelhecer será, fundamentalmente, aquele que proporcionar a relação mais adequada e favorável entre a pessoa idosa e o contexto que a rodeia.
Ana Carolina Almeida – Terapeuta ocupacional, mestranda em Gerontologia Social, Assessora de projetos da AME
Ainda nos primeiros dias de junho de 2021, o médico oftalmologista Alexandre Rosa, de Belém, no Pará, publicou em uma das suas redes sociais uma situação de inclusão e autonomia vivida em seu consultório. Estava encantado com o fato de ter podido se comunicar com seu paciente surdo durante a consulta. “Ao fazer o atendimento a um paciente com deficiência auditiva conheci uma plataforma sensacional: o ICOM Libras“, escreveu ele. E acrescentou: “Nela, um tradutor de Libras atuou como intérprete na consulta, através de uma videochamada ao vivo, traduzindo para mim o que o paciente falava e para ele, o que eu estava explicando. Foi uma experiência maravilhosa”. Ainda segundo o médico, um ótimo exemplo de como a tecnologia pode resolver problemas e aproximar as pessoas.
O ICOM é uma das iniciativas da AME. Conhecer momentos como o vivido pelo médico oftalmologista em seu consultório em Belém é ver se concretizar o trabalho de mais de 30 anos na construção da inclusão com objetivo de dar autonomia às pessoas com deficiência.
O ICOM nasceu com esse objetivo – proporcionar ao surdo independência nas tarefas do dia a dia que envolvam a comunicação. A situação narrada pelo médico é só uma delas. Com o ICOM, o surdo também pode agendar a consulta com o médico sem a necessidade de pedir ajuda a um ouvinte. A tradução simultânea das conversas ocorre em tempo real. E pode ser gravada quando previamente solicitada.
O serviço é oferecido aos cidadãos e também às empresas. A parceria ICOM-empresa estabelece com o cliente todas as funcionalidades a serem adquiridas, inclusive as gravações. Nesse caso, há um termo de confidencialidade assinado com o ICOM, que segue todos os preceitos do Código de Conduta do Profissional Tradutor e Intérprete de LIBRAS/PT.
Começou na quinta-feira, dia 10 de junho, a vacinação para todas as pessoas com deficiência a partir dos 18 anos. Inicialmente, o governo determinou que apenas as pessoas contempladas com BPC (Benefício de Prestação Continuada) é que receberiam a vacina.
Conhecendo a importância da imunização para as pessoas com deficiência permanente e por achar discriminatório o critério da adoção do BPC para iniciar a vacinação, a AME convidou o secretário de saúde do Estado de São Paulo, Jean Carlo Gorinchteyn, a senadora Mara Gabrilli e a professora e médica Linamara Battistella para debater o tema da vacinação em uma Live realizada no início de maio. Na ocasião, o secretário já havia sinalizado aos participantes da live que a ampliação do grupo de pessoas com deficiência vacinadas deveria ocorrer a partir de junho.
Três alunos da Escola Técnica Estadual Lauro Gomes, em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, criaram um programa que emprega Inteligência Artificial (IA) para transformar movimentos e expressões da Língua Brasileira de Sinais em texto. Elaborado por Vinícius Luciano Navarrete da Silva, Luciano dos Anjos Oliveira e Fabrício Holanda de Almeida para o trabalho de conclusão do curso de Técnico em Desenvolvimento de Sistemas, o software é capaz de reconhecer sinais com as mãos, expressões faciais e movimentos do corpo. O projeto, desenvolvido com o sistema operacional Ubuntu, Machine Learning (ML) e código aberto MediaPipe do Google, se classificou entre os dez primeiros na votação popular da 19ª edição da Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace), que aconteceu no mês de março em São Paulo. Agora, que a ferramenta já está apta a converter cerca de 100 sinais de Libras para texto, os jovens estão em busca de intérpretes para aprimorá-la ainda mais. Quem tiver interesse em colaborar pode clicar no link a seguir para entrar em contato por email.
O Decreto Legislativo n° 186 de 09/07/08 aprovou o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que tem como objetivo promover, proteger e assegurar os direitos humanos e liberdades fundamentais para as pessoas com deficiência, e em seu artigo 19 cita a importância da garantia de vida independente e inclusão na comunidade.
A liberdade de escolha e a participação ativa em todas as esferas da vida em sociedade devem ser usufruídas pelas pessoas com deficiência e ofertadas pelo poder público e, acima de tudo, pela própria sociedade, que muitas vezes é a grande causadora das inúmeras barreiras enfrentadas por essa população que busca incessantemente por igualdade de oportunidades. Entendemos como igualdade de oportunidades a condição de participação plena e efetiva em quaisquer situações, não sendo um ganho de privilégios, mas sim garantia de direitos.
A acessibilidade deve ser garantida para que dentro da comunidade haja a possibilidade de uso de todos os serviços, instalações e equipamentos, assim como interação com as demais pessoas, evitando-se assim isolamento ou segregação. Acima de tudo, não basta apenas o uso e interação, é preciso que independência e autonomia estejam presentes, pois assim é garantida tanto a possibilidade de realização de atividades do dia a dia quanto o autogerenciamento e a tomada de decisões.
A vida em sociedade é uma necessidade de todo ser humano e a convivência entre pessoas com e sem deficiência é essencial para que haja uma melhor compreensão acerca de quem é a pessoa com deficiência, suas particularidades, características específicas, eventual necessidade de apoio e principalmente a melhor forma de abordagem e conduta.
Todos nós temos nossa individualidade e a diversidade está implícita em todos, sem exceção. Portanto, uma pessoa com deficiência é uma pessoa como outra qualquer, com seus desejos, aspirações, sonhos, objetivos, medos e história de vida como um todo. Mas, devido ao histórico de segregação e exclusão imposto a essa população, que ainda traz consequências nos dias de hoje, é extremamente necessário e essencial que as pessoas com deficiência estejam cada vez mais presentes na comunidade como um todo, quer seja trabalhando, estudando, viajando, utilizando diferentes meios de transporte e diferentes serviços ofertados a toda população. Elas devem ser vistas, respeitadas e acima de tudo, incluídas. A inclusão pode ser considerada uma via de mão dupla, onde pessoas com deficiência e sociedade se adaptam de forma simultânea para um melhor convívio.
Assim, o convívio entre todos, pessoas com e sem deficiência, pode estimular essa naturalidade que pode e deve existir entre esses dois grupos, por assim dizer, e fazer com que seja observado em todas as pessoas um maior desenvolvimento e uma busca para ultrapassar a própria individualidade, contribuindo assim para o processo de inclusão.
A vida em comunidade também é necessária porque é nela que compartilhamos ideias, sonhos e satisfazemos nossas próprias necessidades. Longe dela, nos isolamos e nos privamos de relacionamentos, que é onde podemos obter as condições básicas para nossa sobrevivência.
Em sociedade, podemos crescer, nos aperfeiçoar e melhorar como seres humanos, e a conquista da independência e autonomia está diretamente ligada a isso. Uma pessoa com deficiência que tem condições asseguradas de mostrar sua independência e autonomia sente-se mais valorizada e apta a manter um bom relacionamento com outras pessoas na comunidade.
Sem dúvida, a conquista da independência e autonomia traz para a pessoa com deficiência a possibilidade de fazer suas próprias escolhas, traçar seu próprio caminho, baseando-se no que entende ser melhor para ela mesma, e não recebendo algo de uma sociedade que, via de regra, ainda se mostra inacessível, segregador e que exclui.
O que ainda falta para termos um país acessível e inclusivo se temos leis e normas que nos direcionam para isso? Desconhecimento dos parâmetros, descaso e, talvez, falta de fiscalização mais rígida. Mas o que contribui muito para isso é a chamada barreira atitudinal, como o próprio nome diz, barreira provocada por uma atitude inadequada, um comportamento muitas vezes embutido nos participantes da própria comunidade e que apagam ou diminuem a independência da pessoa com deficiência.
Independência precisa andar de mãos dadas com a inclusão. Não podemos pensar em uma vida em comunidade caso as pessoas com deficiência não tenham condição de mostrar suas capacidades funcionais e habilidades, sendo assim privadas de participação e de possibilidade de execução de suas funções e atividades relacionadas à vida diária.
Em março de 2020, a organização Mundial de Saúde caracterizou o surto da COVID-19 como uma pandemia, e o mundo passou a tomar medidas sanitárias e de distanciamento social para prevenção, controle e mitigação dessa problemática. Medidas drásticas de isolamento e distanciamento social foram tomadas para proteção e salvamento de vidas.
A pandemia promoveu novas rotinas e modos de vida, modificando a sociabilidade, restringindo a forma de interação, tornando o ambiente familiar a célula principal do confinamento e com novas ações educativas. O computador foi liberado, os jogos, um passatempo que causava desavenças e isolamento entre pais e crianças precisou ser repensado como funcional, a partir desta nova perspectiva.
Se todas as crianças tiveram suas rotinas modificadas, imagine como ficaram as crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) que, quando sofrem uma mudança repentina, sem anúncio anterior, entram em crise, gerando maior estresse no entorno familiar, revelando as dificuldades de lidar com essa situação e a necessidade que ainda temos de elaboração de trabalhos com essas famílias.
Além disso, a pandemia provocou a todos novos hábitos de higienização e costumes. Não podemos sair sem o uso de máscara e não podemos ficar sem higienizar nossas mãos e utensílios. O que cabe pensar, como será que as crianças com TEA compreenderam esses novos hábitos?
Crianças com autismo, em estado grave ou que ainda tem muitos prejuízos de perceber o que está acontecendo, não entenderam o porquê de um dia para o outro, tiveram as suas rotinas retiradas e em casa estão até os dias atuais. Quando conseguem sair, a imposição do uso de uma máscara é colocada, máscara um objeto que abafa a boca e serve para quê?
O TEA é um transtorno que afeta o desenvolvimento de uma criança, desde os seus 03 primeiros anos de vida, comprometendo a comunicação, coordenação motora, socialização, afetando funções como atenção e causando hiperatividade. Os prejuízos mais significativos serão na aprendizagem e interação social. Assim, podemos compreender que, uma criança com TEA pode falar, mas não de maneira efetiva para se comunicar ou compreender totalmente o outro e, como efeito, ela se isola.
Relembrando que ações e diversos trabalhos foram realizados para que escola e tratamentos não parassem, e a saída principal foi a do ensino a distância e do atendimento online, incorporado por diversas instituições. Nesta modalidade, muitas vezes a presença de um acompanhante adulto se faz necessária, como mediação entre a criança e o professor (ou terapeuta) do outro lado da tela. Esta modalidade pode se mostrar eficaz em várias circunstâncias, mas em algumas merece maior atenção.
As crianças com TEA, por exemplo, necessitam de maior mediação para a aprendizagem e, durante a pandemia, quem representou este papel junto às escolas e às terapias acabou sendo a família. Em muitos casos causou-se um aumento do nível de estresse e elevada preocupação, pois pais não são terapeutas nem professores, e isso esbarra no afastamento e distanciamento do interesse em dar continuidade com as atividades online.
A inclusão se caracteriza pelo conjunto de medidas direcionadas ao indivíduo que está excluído do meio social. Nesse momento, não podemos deixar de pensar que a pandemia é o que mais nos preocupa, pois, a contaminação é um risco de vida. No entanto, como faremos com essas crianças, que já têm como características o isolamento e embotamento afetivo? De certa forma, a pandemia está provocando o agravamento do prejuízo social nos casos onde ele já se fazia presente.
Desta forma, julga-se necessário que, quando tivermos a oportunidade de retornarmos às escolas e aos atendimentos presencias, que seja refeita a (re)inclusão dessa criança. Se ela não usar máscara, por não entender a necessidade, ajude-a a compreender. A interlocução com a família e os demais envolvidos neste processo precisa ser acolhida, compreendida e manejada, considerando a singularidade de cada criança, pois uma medida não pode esbarrar em exclusão ou desenvolvimento de novos sintomas.