Por José de Araújo Neto*
Nas últimas semanas, mesmo em meio à pandemia de COVID-19, temos acompanhado um saudável debate em torno do tema da diversidade. Motivado por lamentáveis e trágicos episódios ou fomentado por vozes que precisam se fazer ouvir, o assunto foi capaz de dividir as manchetes com a maior crise sanitária de nossa geração. Vimos muitas discussões sobre racismo, homofobia, machismo e desigualdades sociais, temas absolutamente relevantes e urgentes, no mundo todo. Senti falta, no entanto, de uma discussão mais ampla e aprofundada também sobre os direitos das pessoas com deficiência. Se realmente desejamos promover a inclusão e a diversidade em nossa sociedade, não podemos deixar ninguém de fora. Ninguém.
Aproveito os cinco anos da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI), completados este mês, para fazer essa provocação. Relatório da consultoria McKinsey publicado em junho informa que companhias com mais diversidade apresentam melhor desempenho financeiro. De acordo com o documento, empresas com quadros de funcionários mais diversos têm lucro 21% maior quando há diversidade de gênero e 35% maior quando há diversidade racial. O efeito é similar quando pessoas com deficiência fazem parte das equipes. As organizações que são capazes de captar todos os olhares presentes na sociedade, considerar todas as perspectivas e trabalhar com o conjunto diversificado de realidades certamente serão mais bem-sucedidas, mais admiradas e mais duradouras.
Graças à LBI, temos no Brasil um arcabouço legal e regulatório robusto, capaz de estimular a inclusão plena das pessoas com deficiência nos espaços públicos, nos locais de trabalho, nas áreas de lazer e nos centros de consumo. Para tornar realidade esse cenário, porém, é preciso mais do que leis e iniciativas pontuais: precisamos mudar a maneira com que a sociedade enxerga a questão. Ainda que a legitimidade dos direitos das pessoas com deficiência tenha sido reconhecida pela Constituição de 1988, caminhamos pouco no entendimento do papel de cada um de nós para garantir esses direitos.
No passado, as instituições de apoio eram o principal espaço de acolhimento e convivência para essa população. Viviam numa realidade paralela, apartados do convívio e da vida em sociedade. Ali eles estudavam, trabalhavam, praticavam esportes, frequentavam festas e eventos. Essa realidade mudou e não é mais aceitável hoje em dia. As pessoas com deficiência devem usufruir integralmente dos mesmos espaços que os demais cidadãos, com autonomia e independência. Para tanto, é preciso que não apenas elas estejam equipadas para isso, mas que, principalmente, as estruturas sejam preparadas e adaptadas para recebê-las. No exemplo mais banal: de nada adianta um deficiente físico ter uma cadeira de rodas se não houver rampas nas calçadas, nos prédios públicos, nas escolas, nos bancos, nas praças, nos museus, nos cinemas, nos estádios de futebol ou em qualquer outro lugar que o indivíduo deseje frequentar.
Precisamos assimilar que a responsabilidade de garantir a inclusão das pessoas com deficiência é de todos. As empresas precisam ser mais flexíveis ao planejar seus espaços para que possam oferecer-lhes atendimento eficiente, em ambientes confortáveis e seguros. Além disso, quando tiverem que contratar pessoas com deficiência, devem se organizar para garantir-lhes as condições adequadas para o exercício pleno de suas atribuições. O mesmo vale para os espaços públicos e coletivos, áreas de lazer e centros de consumo. Já aprendemos que estimular e acolher a diversidade é vital para o futuro da própria civilização. As pessoas com deficiência são parte fundamental nessa equação, pois são cidadãos, profissionais e consumidores como cada um de nós.
*José de Araújo Neto é presidente da AME